domingo, 18 de maio de 2008

Resumo: A dinâmica do cuidado em saúde mental

TEMA DO PROJETO: As relações de poder entre os saberes no cuidado psicopatológico

EQUIPE: André Mattos, Felipe Lôbo, Victor Martins

ARTIGO:

NUNES, M. et al. A dinâmica do cuidado em saúde mental: signos, significados e práticas de profissionais em um Centro de Assistência Psicossocial em Salvador, Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 24(1): 188-196, jan., 2008.


O artigo relata uma pesquisa realizada em um CAPS, em Salvador, com o fim de analisar o sistema de signos, significados e práticas em saúde mental utilizados pelos profissionais.
O tema é introduzido apresentando-se os diferentes movimentos, em diferentes países, que levaram aos modelos de reforma psiquiátrica, cujo ponto em comum seria a busca da superação do modelo manicomial, e cujas diferenças residem na magnitude da relação estabelecida com o espaço sócio-cultural. A reforma italiana é a que parece ter tido um maior alcance político, a exemplo da lei de 1978 que extinguia os manicômios. Inspirada no modelo italiano, a reforma brasileira inicia-se no fim dos anos 70, com a proposta de uma atenção psicossocial integrada, práticas interdisciplinares, um sistema extra-hospitalar de cuidados e a defesa da cidadania dos portadores de doenças mentais. Na década de 90, já com maior força, a reforma é marcada pela desospitalização seguida da criação de serviços substitutivos.
A estratégia metodológica utilizada denomina-se sistema de signos, significados e práticas em saúde mental, ‘um modelo semiológico e contextual que busca identificar categorias usadas por diferentes subgrupos de pessoas para identificar, explicar e reagir a problemas de saúde mental’. Foi realizada uma pesquisa etnográfica no CAPS, durante nove meses, além de entrevistas semi-estruturadas com os profissionais de nível superior e três grupos focais.
É destacada a constatação de que o CAPS é uma instituição que se constitui como ‘fonte de vida’ para seus usuários, percepção comum a todos os profissionais, alguns dos quais constatam o efeito benéfico aos usuários por uma intuição afetiva, sem maior reflexão, o que se relaciona à humanização das relações interpessoais. É consenso entre os profissionais que o CAPS ainda tem muitas dificuldades, mas a mudança no modelo de cuidado é evidente. Os profissionais afirmam haver um roteiro de entrevista, para realização da triagem, orientado para abranger os diversos aspectos do problema, de acordo com a proposta de ver a pessoa em sua integralidade. A triagem é também orientada para ser realizada por pelo menos dois profissionais, entretanto, na prática, a orientação não tem sido muito respeitada, assim como o roteiro de entrevista, que acaba tendendo à perspectiva médica.
Diversos trechos de entrevistas são apresentados, ilustrando a análise dos signos, significados e práticas dos profissionais. É observado que, apesar de haver contradições no componente semiológico da pesquisa (o sistema de signos), estas são superadas quando associadas à prática. O modelo asilar parece bem superado, de modo que os critérios de aceitação do usuário dão grande ênfase à dimensão social, não se restringindo aos rótulos de neurótico e psicótico grave; a avaliação da evolução clínica também valoriza bastante a dimensão social.
A partir da observação das diferentes concepções de cuidado em saúde mental no CAPS estudado, foram delimitados três modelos distintos de cuidado. O primeiro, chamado de ‘modelo biomédico humanizado’, tem ênfase na psicopatologia, com um cuidado assistencialista e pedagógico, visando uma mudança de comportamento que possibilite a reinserção social. O segundo é o ‘modelo psicossocial com ênfase na instituição’, que traz o cuidado psicossocial, mas limitado à instituição, com influência da clínica psicanalista. O terceiro, o ‘modelo psicossocial com ênfase no território’, valoriza mais os aspectos sociais, vinculando seu trabalho com as esferas familiar e comunitária.
Argumenta-se que há vantagens e desvantagens em cada modelo, e que, apesar das divergências, há um reconhecimento geral da particularidade dessa nova modalidade de cuidado em saúde mental que o CAPS representa. As relações interpessoais tomam o primeiro plano, antecedendo as técnicas terapêuticas, em contraste com o modelo asilar, havendo também avanço no trabalho clínico. Foi percebida, entretanto, uma escassez de discussões acerca dos aspectos teórico-metodológicos por trás dos diferentes modelos de cuidado. Por fim, são apresentadas algumas reflexões sobre esse processo de mudança, que apesar de caminhar na direção almejada, ainda encontrada seus empecilhos.

4 comentários:

Ana Paula disse...

Achei o resumo do artigo bem-estruturado, o qual contribui para nos situar no âmbito de pesquisa proposto pela equipe. Além disso, achei interessante a estratégia metodológica utilizada pelo autor do artigo, a qual pode ser satisfatória para apreender os sistemas de significados e signos em meio aos profissionais que atuam em Saúde Mental. Portanto, a primeira vista, penso que o artigo pode ser favorável para o projeto de pesquisa da equipe, já que traz uma proposta metodológica que parece ser condizente com o tema de pesquisa (As relações de poder entre os saberes no cuidado psicopatológico).

Fernanda Leão disse...

Achei o artigo, tanto quanto o tema da pesquisa bastante pertinente, em vista da reforma psiquiátrica em curso atualmente. Contudo, tive a impressão de que o artigo é um tanto otimista, na medida em que não analisa as difuculdades encontradas nesse novo modelo de assistência psicossocial, e os empecilhos que ainda persistem, como por exemplo, as relações de poder entre os saberes no cuidado psicopatológico. Porém, isso pode ser devido ao fato de que não tive acesso ao artigo completo, mas apenas a este resumo. Acho que alguns pontos deveriam ter sido enfatizados, como "o roteiro de entrevista, que acaba tendendo à perspectiva médica". O fato de observarmos que o CAPS tem se mostrado a alternativa ideal, mais humana, e mais avançada em relação aos manicômios, não nos impede de procurar e denunciar as suas falhas, de forma a proporcionar cada vez mais um tratamento adequado aos pacientes de saúde mental.
Bom, é isso! :)

Fernanda

Victor Martins disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Victor Martins disse...

a própria tendência médica da entrevista seria a constatação de um empecilho dentre outros, se tratando de relações de poder entre as disciplinas à medida que há uma maior regularidade do discurso médico em detrimento a outros discursos.